Post by amm on Jun 20, 2019 8:38:03 GMT
COM O DIABO NO CORPO
Joaquim Mauro confessou à polícia ter esfaqueado e violado uma menor. O crime foi ditado pelo Diabo, ou assim defende o estofador de 27 anos, que tinha uma lista de outras três pessoas a abater. A começar pela mãe.
18 de Abril de 2004 às 17:42
Mónica já viu o Diabo de frente. Estava todo vestido de preto e trazia um facalhão em riste. No entanto esta jovem de 17 anos jura a pés juntos que foi o seu primeiro e único contacto visual com o Satanás. Antes só tinha falado com ele ao telemóvel. “Ele telefonou a dizer que queria ver-me. Eu respondi que não porque não o conhecia de lado nenhum”, recorda três dias depois de ter sido protagonista de um ritual satânico que está a abalar o concelho de Chaves.
Mónica desligou o telefone e voltou à lida da casa. Como estava sozinha – os pais, os dois irmãos e os avós paternos tinham ido passar o Domingo de Páscoa na aldeia do Ventoso, em Abrantes – ainda teve tempo de comer um empadão de galinha, arrumar a cozinha e recolher o lixo. Eram cerca das três da tarde quando saiu para depositar o saco do lixo num contentor que fica mesmo em frente à casa do Diabo, no número 41 da Rua Comendador Pereira da Silva, no Bairro do Alto da Trindade.
Diz ela que foi ali que o seu caminho se cruzou com o espírito do Mal. Um espírito especial porque tem nome, chama-se Joaquim Mauro, e profissão, é estofador de sofás. “Ele é um verdadeiro artista da estofaria”, confessa a mãe toda orgulhosa.
Na casa do demo O contentor do lixo foi a última fronteira antes de entrar no santuário do Diabo. “Ele atravessou a rua e dirigiu-se para mim com um facalhão daqueles de matar porcos que trazia enrolado numa manta. Depois disse-me: ‘Quero falar contigo’ e eu respondi mais uma vez que não o conhecia.”
Na versão da vítima, ao ouvir a resposta, ele perdeu as estribeiras. “Pegou-
-me no braço (mostra uma nódoa negra) e disse: ‘ Ou vens comigo ou mato-te!”. O medo paralisou-lhe qualquer tentativa de resistência. “Foi quando ele me meteu à força dentro de casa.”
Dona Natália, a mãe do Joaquim Mauro, não assistiu ao encontro – “No Domingo dei um saltinho até Mirandela para ver as beiras do rio que são muito bonitas” – mas abana a cabeça quando lhe contam esta parte da história. “Tenho certeza que o meu filho não a forçou a nada. Há mais de um ano que a Mónica frequentava a nossa casa. Passava horas com ele trancada no quarto. Uma vez ouvi uns gemidos mas não sei o que andavam a fazer”, afirma.
Uma amiga da família acena afirmativamente com a cabeça. E deita mais uma acha para a fogueira. “Ele passava a vida a dizer ‘esta gaja não me deixa em paz’. E eu própria já ouvi a Mónica a dizer que ele era o pai ideal para os filhos dela.”
Quando o Diabo bateu com a porta de alumínio nem sequer teve tempo de esfregar o olho. “Fomos logo para o seu quarto, que é na segunda porta à direita no corredor”, conta Mónica. Mas o refúgio de Joaquim Mauro não tinha a decoração normal para um jovem de 27 anos. “Era escuro, tinha desenhos com extraterrestres por todo o lado, morcegos e lagartos pendurados no tecto, muitos vídeos e uma forquilha do Diabo pintada na parede”, recorda a vítima. “Estava pintada a sangue”, acrescenta.
“Aquilo não é sangue. É tinta vermelha que sobrou da pintura do carro”, protesta Dona Natália. E para provar a sua convicção passa um pano molhado sobre a cruz com toda a força que lhe resta na alma das mãos.
O que se passou a seguir é digno de um filme de terror. “Ele sentou-
-me na cama e deitou-se em cima de mim. Eu empurrei-o”, diz Mónica, enquanto ganha novo fôlego para continuar a desfiar o novelo satânico. Nesta altura do ritual o estofador já estava de cabeça perdida – fazia vozes esquisitas, revirava os olhos, dizia que estava possuído pelo Diabo. Gritava que a queria matar. “Foi quando me deu facadas nas costas e na cabeça, despiu-me e violou-me”, acrescenta a vítima com os olhos embaciados.
O 'Satanás' do bairro do Alto da Trindade confirmou isso mesmo à Polícia. E disse mais: penetrei-a por treze vezes, confessou. Treze, o número com que forrava as paredes do seu quarto, treze, o número do seu porta-chaves com uma bola de ‘snooker’. Treze, a fixação que lhe angustiava os neurónios.
Nas mãos de Satanás Depois de consumada a violação, Joaquim Mauro fez questão de ser ele próprio a vestir a vítima. Mas mal colocou a última peça de roupa voltou a ficar fora de si. “Perguntou-me se era virgem e respondi que não. Ele ficou exaltado porque disse que precisava de uma mulher em estado de pureza para conseguir a vida eterna.”
Foi então que se lembrou da irmã de Mónica, uma bebé de cinco meses. “Disse-
-me que ia ligar ao meu pai a dizer para a trocar por mim, ao que eu disse que preferia morrer do que lhe entregar a minha irmã”, sublinha Mónica que já estava mais morta do que viva dada a quantidade de sangue que entretanto tinha perdido. Mesmo assim o pesadelo parecia não ter fim. As ameaças também não. “Ele disse que me ia queimar a cara com diluente e fechar-me os olhos com super-cola.” E mais: “Que me cortava às postas e punha no congelador para depois comer.”
Mónica via com cada vez mais nitidez a sua vida a andar para trás. Mas nunca deixou de falar, de suplicar, de tentar convencer o seu agressor a poupar-lhe a vida. Às vezes era um verdadeiro diálogo de surdos. “Dizia-lhe que estava disposta a tudo desde que me poupasse a vida. Ele respondia que tinha entregue a alma ao Diabo e que ele agora era o próprio Diabo.”
O tempo escorria lentamente, ela prostrada sobre a cama, afogada numa poça de sangue. Só duas horas depois do encontro no contentor do lixo é que ele ligou para o 112. “Disse-lhes que tinha uma menor em seu poder, que a tinha esfaqueado e violado, e para virem depressa porque senão poderiam chegar tarde demais.” A ambulância e o carro da polícia chegaram dez minutos depois. A vítima foi conduzida ao hospital para receber tratamento. Ele para o estabelecimento prisional de Chaves onde se encontra em prisão preventiva.
Filme de terror A notícia do ritual satânico correu depressa pelo bairro. E apanhou toda a gente de surpresa. “Ele até era um bom rapaz”, confessa o seu senhorio. Dito isto acrescenta: “O único problema é que falava demais, atinava com o negro e gostava de caveiras.” Já os outros vizinhos recordam-no como um jovem fechado no seu próprio mundo. “Passava sempre com a cabeça amarrada para baixo, não dizia nem bom dia nem boa tarde, era de poucas conversas”, é este o perfil traçado por dona Maria, uma contínua da Escola 1 2 3 Nadir Afonso, em Chaves, que está a redigir um abaixo assinado para expulsar do bairro a família do jovem satânico.
O único amigo de peito que se lhe conhece é o ‘Zé Cigano’. O senhorio tem de novo a palavra: “Ele ficava até muito tarde em casa dele a jogar nos computadores.” Tirando isso ninguém encontra mais nada a apontar. “Nunca vi coisa assim. Ninguém pensava que ele pudesse fazer uma coisa destas”, desabafa D. Maria. Nem mesmo a mãe.
Dona Natália ainda está meio acabrunhada com a desgraça que lhe bateu à porta. “Ele era pacato, normal, brincalhão mas era mais do estilo criança do que de homem daquela idade”, explica com uma lágrima no canto do olho. Beto ouve a mãe com atenção e acrescenta: “Ele podia ter aquela idade mas tinha uma cabeça de 12 anos.” Dona Natália concorda com o diagnóstico. E antes de voltar a mergulhar no pesadelo deixa escapar uma confidência. “É o melhor rapaz do mundo, um anjo de bondade. Ele não dava um passo sem mim, e eu sem ele.”
Desde Domingo passado que a mãe do jovem satânico procura desesperadamente encontrar uma explicação para o filme de terror. “Quando aquilo aconteceu foi como se uma mão tivesse entrado no meu peito e arrancado o coração.”
Passa horas a desfiar as pontas de uma vida feita de muitas rotinas, noites em branco e a tentar encontrar o fio condutor que abriu caminho à tragédia anunciada. “Ele falava muito no Diabo” reconhece amargurada. E ela, uma religiosa devota, achava muito estranho. Um dia encheu-se de coragem e disse-lhe que talvez fosse melhor interná-lo “numa casa de psiquiatria”. Ele limitou-se a responder: “Nem pensar... tu é que não andas bem da medula.” A dona Natália, que como todas as mães tem cor
www.cmjornal.pt/mais-cm/domingo/detalhe/com-o-diabo-no-corpo
Joaquim Mauro confessou à polícia ter esfaqueado e violado uma menor. O crime foi ditado pelo Diabo, ou assim defende o estofador de 27 anos, que tinha uma lista de outras três pessoas a abater. A começar pela mãe.
18 de Abril de 2004 às 17:42
Mónica já viu o Diabo de frente. Estava todo vestido de preto e trazia um facalhão em riste. No entanto esta jovem de 17 anos jura a pés juntos que foi o seu primeiro e único contacto visual com o Satanás. Antes só tinha falado com ele ao telemóvel. “Ele telefonou a dizer que queria ver-me. Eu respondi que não porque não o conhecia de lado nenhum”, recorda três dias depois de ter sido protagonista de um ritual satânico que está a abalar o concelho de Chaves.
Mónica desligou o telefone e voltou à lida da casa. Como estava sozinha – os pais, os dois irmãos e os avós paternos tinham ido passar o Domingo de Páscoa na aldeia do Ventoso, em Abrantes – ainda teve tempo de comer um empadão de galinha, arrumar a cozinha e recolher o lixo. Eram cerca das três da tarde quando saiu para depositar o saco do lixo num contentor que fica mesmo em frente à casa do Diabo, no número 41 da Rua Comendador Pereira da Silva, no Bairro do Alto da Trindade.
Diz ela que foi ali que o seu caminho se cruzou com o espírito do Mal. Um espírito especial porque tem nome, chama-se Joaquim Mauro, e profissão, é estofador de sofás. “Ele é um verdadeiro artista da estofaria”, confessa a mãe toda orgulhosa.
Na casa do demo O contentor do lixo foi a última fronteira antes de entrar no santuário do Diabo. “Ele atravessou a rua e dirigiu-se para mim com um facalhão daqueles de matar porcos que trazia enrolado numa manta. Depois disse-me: ‘Quero falar contigo’ e eu respondi mais uma vez que não o conhecia.”
Na versão da vítima, ao ouvir a resposta, ele perdeu as estribeiras. “Pegou-
-me no braço (mostra uma nódoa negra) e disse: ‘ Ou vens comigo ou mato-te!”. O medo paralisou-lhe qualquer tentativa de resistência. “Foi quando ele me meteu à força dentro de casa.”
Dona Natália, a mãe do Joaquim Mauro, não assistiu ao encontro – “No Domingo dei um saltinho até Mirandela para ver as beiras do rio que são muito bonitas” – mas abana a cabeça quando lhe contam esta parte da história. “Tenho certeza que o meu filho não a forçou a nada. Há mais de um ano que a Mónica frequentava a nossa casa. Passava horas com ele trancada no quarto. Uma vez ouvi uns gemidos mas não sei o que andavam a fazer”, afirma.
Uma amiga da família acena afirmativamente com a cabeça. E deita mais uma acha para a fogueira. “Ele passava a vida a dizer ‘esta gaja não me deixa em paz’. E eu própria já ouvi a Mónica a dizer que ele era o pai ideal para os filhos dela.”
Quando o Diabo bateu com a porta de alumínio nem sequer teve tempo de esfregar o olho. “Fomos logo para o seu quarto, que é na segunda porta à direita no corredor”, conta Mónica. Mas o refúgio de Joaquim Mauro não tinha a decoração normal para um jovem de 27 anos. “Era escuro, tinha desenhos com extraterrestres por todo o lado, morcegos e lagartos pendurados no tecto, muitos vídeos e uma forquilha do Diabo pintada na parede”, recorda a vítima. “Estava pintada a sangue”, acrescenta.
“Aquilo não é sangue. É tinta vermelha que sobrou da pintura do carro”, protesta Dona Natália. E para provar a sua convicção passa um pano molhado sobre a cruz com toda a força que lhe resta na alma das mãos.
O que se passou a seguir é digno de um filme de terror. “Ele sentou-
-me na cama e deitou-se em cima de mim. Eu empurrei-o”, diz Mónica, enquanto ganha novo fôlego para continuar a desfiar o novelo satânico. Nesta altura do ritual o estofador já estava de cabeça perdida – fazia vozes esquisitas, revirava os olhos, dizia que estava possuído pelo Diabo. Gritava que a queria matar. “Foi quando me deu facadas nas costas e na cabeça, despiu-me e violou-me”, acrescenta a vítima com os olhos embaciados.
O 'Satanás' do bairro do Alto da Trindade confirmou isso mesmo à Polícia. E disse mais: penetrei-a por treze vezes, confessou. Treze, o número com que forrava as paredes do seu quarto, treze, o número do seu porta-chaves com uma bola de ‘snooker’. Treze, a fixação que lhe angustiava os neurónios.
Nas mãos de Satanás Depois de consumada a violação, Joaquim Mauro fez questão de ser ele próprio a vestir a vítima. Mas mal colocou a última peça de roupa voltou a ficar fora de si. “Perguntou-me se era virgem e respondi que não. Ele ficou exaltado porque disse que precisava de uma mulher em estado de pureza para conseguir a vida eterna.”
Foi então que se lembrou da irmã de Mónica, uma bebé de cinco meses. “Disse-
-me que ia ligar ao meu pai a dizer para a trocar por mim, ao que eu disse que preferia morrer do que lhe entregar a minha irmã”, sublinha Mónica que já estava mais morta do que viva dada a quantidade de sangue que entretanto tinha perdido. Mesmo assim o pesadelo parecia não ter fim. As ameaças também não. “Ele disse que me ia queimar a cara com diluente e fechar-me os olhos com super-cola.” E mais: “Que me cortava às postas e punha no congelador para depois comer.”
Mónica via com cada vez mais nitidez a sua vida a andar para trás. Mas nunca deixou de falar, de suplicar, de tentar convencer o seu agressor a poupar-lhe a vida. Às vezes era um verdadeiro diálogo de surdos. “Dizia-lhe que estava disposta a tudo desde que me poupasse a vida. Ele respondia que tinha entregue a alma ao Diabo e que ele agora era o próprio Diabo.”
O tempo escorria lentamente, ela prostrada sobre a cama, afogada numa poça de sangue. Só duas horas depois do encontro no contentor do lixo é que ele ligou para o 112. “Disse-lhes que tinha uma menor em seu poder, que a tinha esfaqueado e violado, e para virem depressa porque senão poderiam chegar tarde demais.” A ambulância e o carro da polícia chegaram dez minutos depois. A vítima foi conduzida ao hospital para receber tratamento. Ele para o estabelecimento prisional de Chaves onde se encontra em prisão preventiva.
Filme de terror A notícia do ritual satânico correu depressa pelo bairro. E apanhou toda a gente de surpresa. “Ele até era um bom rapaz”, confessa o seu senhorio. Dito isto acrescenta: “O único problema é que falava demais, atinava com o negro e gostava de caveiras.” Já os outros vizinhos recordam-no como um jovem fechado no seu próprio mundo. “Passava sempre com a cabeça amarrada para baixo, não dizia nem bom dia nem boa tarde, era de poucas conversas”, é este o perfil traçado por dona Maria, uma contínua da Escola 1 2 3 Nadir Afonso, em Chaves, que está a redigir um abaixo assinado para expulsar do bairro a família do jovem satânico.
O único amigo de peito que se lhe conhece é o ‘Zé Cigano’. O senhorio tem de novo a palavra: “Ele ficava até muito tarde em casa dele a jogar nos computadores.” Tirando isso ninguém encontra mais nada a apontar. “Nunca vi coisa assim. Ninguém pensava que ele pudesse fazer uma coisa destas”, desabafa D. Maria. Nem mesmo a mãe.
Dona Natália ainda está meio acabrunhada com a desgraça que lhe bateu à porta. “Ele era pacato, normal, brincalhão mas era mais do estilo criança do que de homem daquela idade”, explica com uma lágrima no canto do olho. Beto ouve a mãe com atenção e acrescenta: “Ele podia ter aquela idade mas tinha uma cabeça de 12 anos.” Dona Natália concorda com o diagnóstico. E antes de voltar a mergulhar no pesadelo deixa escapar uma confidência. “É o melhor rapaz do mundo, um anjo de bondade. Ele não dava um passo sem mim, e eu sem ele.”
Desde Domingo passado que a mãe do jovem satânico procura desesperadamente encontrar uma explicação para o filme de terror. “Quando aquilo aconteceu foi como se uma mão tivesse entrado no meu peito e arrancado o coração.”
Passa horas a desfiar as pontas de uma vida feita de muitas rotinas, noites em branco e a tentar encontrar o fio condutor que abriu caminho à tragédia anunciada. “Ele falava muito no Diabo” reconhece amargurada. E ela, uma religiosa devota, achava muito estranho. Um dia encheu-se de coragem e disse-lhe que talvez fosse melhor interná-lo “numa casa de psiquiatria”. Ele limitou-se a responder: “Nem pensar... tu é que não andas bem da medula.” A dona Natália, que como todas as mães tem cor
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